A velha bicicleta

*Felipe Pereira


Se me apego à imagem da minha meninice, é porque eu queria estar lá outra vez. Porém, é impossível retroceder ao passado, a não ser através das crônicas. Se escolhi a literatura como paixão, foi justamente para continuar pondo em um retrato textual as minhas saudades daqueles bons períodos que escorreram com as areias do tempo.

Nesta pequena crônica, trago a você, meu caro e estimado leitor, um fato que se cravou em minha mente. Certo dia, não me lembro qual, meu pai precisou se locomover à cidade vizinha. Naquele tempo, não tínhamos muitos recursos financeiros; não passávamos necessidades, mas o luxo era somente mais uma palavra no vocabulário. Então meu pai foi com sua bicicleta.

 — Pai, eu quero ir! — Falei para ele.

 — Não, é doido! É longe para você ir. — Retorquiu meu genitor.

As duas cidades eram separadas por aproximadamente dez quilômetros. Se percorrido esse trajeto de carro, não é tão distante. Mas para quem segue o mencionado trajeto de bicicleta, além de ser longe, é cansativo.

 — Eu quero ir! — Fui contundente.

De tanto eu insistir, meu pai acabou cedendo. O que ele nunca entendeu, e talvez o que ele tenha interpretado como birra de criança, foi, na verdade, um ato de proteção. Eu, na minha inocência de criança, achava a estrada perigosa, e mesmo que eu em nada o protegesse, iria sentir-me mais tranquilo sabendo que eu estava ali, velando por ele o caminho todo.

Aqueles dez quilômetros pareciam não ter fim. Ora meu pai levava-me na garupa, ora íamos andando. Devo dizer, nunca me diverti tanto. O cansaço foi um preço pequeno a se pagar pelo momento que tive com meu pai. Aquela velha bicicleta, se pudesse enxergar, veria um menino alegre, aproveitando a caminhada ao lado de seu herói.

Recordo-me também, que na hora de voltar, um amigo de meu pai, que na ocasião dirigia um transporte rodoviário, ofereceu-se para me levar, no que eu respondi:

 — Não quero!

 — Vai com ele, vai ser melhor para você.

Outra vez bati o pé e fiz minha vontade prevalecer. Voltei com meu pai; da mesma maneira, ora na garupa, ora andando.

Talvez, hoje ele não se recorde muito dos detalhes daquele dia; até mesmo eu não me lembro direito. Entretanto, guardo com carinho aquelas horas que estive com o homem que me criou; assim como muitas outras horas que estive com ele em outros momentos e situações. Porque eu sei que um dia o sol se põe para todos e o que nos resta no fim, é a cruel saudade.

*Estudante de contabilidade e morador de Nova Andradina

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Jornal da Nova

Cobertura do Jornal da Nova

Quer ficar por dentro das principais notícias de Nova Andradina, região do Brasil e do mundo? Siga o Jornal da Nova nas redes sociais. Estamos no Twitter, no Facebook, no Instagram e no YouTube. Acompanhe!